“Precisamos conhecer o Brasil. A diversidade biológica é muito grande e só estamos conhecendo à medida que estamos perdendo, é uma corrida contra o tempo. Temos que fazer a população conhecer isso antes que desapareça”.
A frase acima, de Cristiano Nogueira, é citada pelo jornalista Geraldo Elísio como uma espécie de resumo do processo de desconhecimento e destruição da diversidade ambiental do país.
Tendo como referência o Grande Sertão: veredas, de Guimarães Rosa, Geraldo Elísio, em duas reportagens e um documentário publicados pelo Viomundo, nos apresenta o bioma cerrado e aponta para os danos que a expansão de florestas de eucalipto acarretam para a diversidade da flora e da fauna da região do cerrado, que cobre 23% do território nacional e se tornou, desde os anos 70, a principal área de produção agrícola e agropecuária do Brasil.
Transcrevo aí em baixo um pedaço do diálogo entre o autor e o motorista que o conduz no trajeto entre Sete Lagoas e Curvelo, da reportagem que é o título desta postagem e que pode ser lida na íntegra clicando aqui: Do Grande Sertão de Guimarães Rosa quase não há mais veredas; virou um eucaliptal.
Deixo aqui o link para o vídeo Manuelzão, Bananeira e o Sertão. E aqui o link para a reportagem fotográfica Quando todo o sertão estiver coberto de eucalipto, Deus criará outro com mesma fauna e vegetação?
Vamos então ao diálogo prometido:
“E Riobaldo Tatarana e Diadorim?
— Me desculpe, mas não conheço, não.
– E o pequi? Protegido por Lei Federal?
— Acho que as empresas não estão preocupadas não. Oh… Qué sabé?… Tão indo embora também mangaba, araticum, buriti, gabiroba, cagaita, bocaiuva, gengibre, cajá-manga.
Um tanto de remédio de mato. Igual ao chapéu-de-couro, quebra-pedra, arnica, losna… Esses trem que a gente usa desde tempos antigos. Coisas dos índios. Quebra-pedra é muito bom prá os rins. Arnica cura muita dor e machucado. Será que empresa interessa explorar? Mas o senhor me dá licença para parar no posto e completar o tanque de gasolina?
…
Então tudo está acabando?
— Parece que sim.
De fato, aliado a outros fatores, inclusive caça predatória já não se vê mais tamanduá-bandeira, lobo-guará, ariranha, anta (o maior mamífero da América do Sul), onça pintada, onça parda e onça preta, macaco, mico, gato-maracajá, raposa, jaguatirica, veado.
Uma imensa fauna que o ICM-Bio diz correr risco de extinção.
…
É amigo. Primeiro, cortaram o sertão para transformá-lo em carvão. Agora, além de cortá-lo, plantam eucalipto e continuam a desmatá-lo. Eu não vi ou ouvi um passarinho cantar! E nem maritaca voar, fazendo algaravia.
— Passarinho!… Aves… Olha jornalista… ema, sabiá, curió, canarinho da terra, pintassilgo, pintagol, pássaro preto, rolinha, fogo pagô, até pardal, tudo está sumindo…
Imagina seriema… Some por não ter mais coral, jararaca, urutu, cascavel e outras cobras pra elas comer. O senhor não vai ver jaó, inhambu-xintã, trocal, mutum, pica-pau, inhambu-chororó, coruja de todo jeito, azulão, caburé, arara-canindé, arara-azul-grande, papagaio, maritaca, arara-vermelha.
…
No meio do eucalipto não se vê nada disso, não. Você já viu?
— Claro que não.
— Então alguma coisa estranha deve existir. Engraçado! Parece até os rios e córregos estão secando.
— Jornalista isso é triste. Não é engraçado, não. Também não tem inseto, nada pra eles comer. O senhor já viu borboleta no meio de eucalipto?
Antigamente tinha uma borboleta grande, de asa toda azul, com as beiradas riscadas de preto… Era lindo. Maior que o tamanho de uma mão bem grande de um homem adulto. Dono de uma mãozona.
Aranha, só come inseto, vai morrer de fome?
Abelha também sumiu e toda qualidade de flor de cor e tamanho também.
Vagalume toda noite se confundia com as estrela. Sumiu do céu. Até lagarto, acredita? Tem tempo não vejo mais. Os bichos mudam. Vão procurar comida e água.”